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segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Ameaça


 
Sei que estamos na semana do Natal, período em que os cidadãos procuram alhear-se dos problemas do mundo. É humanamente compreensível. Mesmo assim, não consigo deixar de vir a este espaço público lançar novo alerta para a tragédia política que se vai desenvolvendo nos EUA. Tenho crescentes dúvidas relativamente às próximas eleições presidenciais em que o Sr.Donald pretende ser reeleito. Haverá nessa altura, no final do próximo ano, uma real possibilidade de realização de eleições democráticas nos EUA? Suspeito já estar em curso um sinistro plano táctico de desmocratização do processo eleitoral. Estou já a adivinhar ir surgir um grave acontecimento, provavelmente um conflito bélico artificialmente criado e bem encenado, para que sejam dados poderes excepcionais ao presidente, acrescidos de motivos para o adiamento das eleições. O caso Coreia do Norte é o que está mais à mão para que se alcancem os objectivos antidemocráticos pretendidos. Veja-se a manchete de hoje da Fox News online, assim como o artigo que lhe está associado em que se noticia o que se passou ontem. É dito o seguinte:

«U.S. officials on Sunday were on high alert due to a possible North Korean missile launch that has been menacingly referred to by Pyongyang as a "Christmas gift." [John] Bolton said in the interview [published on Axios] that if Kim makes good on the threat and launches a missile the White House should do something "that would be very unusual"».

Mesmo que se consigam realizar eleições democráticas em 2021, duvido seriamente que o Sr.Donald J. Trump aceite os resultados eleitorais caso estes não lhe sejam favoráveis.

O que se está a passar nos EUA é uma verdadeira tragédia política para o próprio país e para o mundo.

João Maria de Freitas Branco
Caxias, 23 de Dezembro de 2019

 

quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

Como combater?


No seguimento do texto “Do Erro à Lição” (17/dez./2019)

A melhor forma de combater a extrema-direita é concretizar políticas que concorram para a Liberdade, para a Igualdade, para a Justiça social e, consequentemente, para uma objectiva melhoria das condições reais de vida dos cidadãos. O totalitarismo só germina em momentos de crise aguda (veja-se o exemplo do Peru, por mim referido num dos últimos textos publicados no blog Razão – razaojmfb.blogspot.com). Outra forma essencial de combater a extrema-direita é a contra-argumentação racional (estribada na Moral, na Verdade, na Lógica, no Rigor, na Fundamentação, na Clareza). Pretender travar esse combate utilizando a agressão com rótulos, o rancor, o ódio é servir os interesses dos partidários do totalitarismo. O rancor, o ódio causam polarização crescente e a polarização extrema serve objectivamente os interesses da extrema-direita, conduzindo à estruturação de formas de totalitarismo.

Considero importantíssimo impedir a queda na polarização extrema. A tragédia política que está a ocorrer nos EUA deve servir de exemplo. Há que conter o efeito cascata: o rancor causa polarização crescente; a polarização conduz à “recessão democrática” (Larry Diamond), serve a desdemocratização acelerada; a desmocratização acelerada asfixia a Liberdade, a Igualdade, a Justiça; sem Liberdade, Igualdade e Justiça o recurso à violência acentua-se; o Mal germina; o Mal organiza-se e institucionaliza-se em regimes totalitários. É a cascata do Terror, porque é aí que a sua água irá desaguar. Depois, repentinamente, o Mal extremo aparecerá solidificado.

O sucesso eleitoral do nacional-populismo não me parece ser imediata expressão de um renascimento do fascismo ou do nazismo. É fruto de um sentimento generalizado de desilusão, de decepção, desencantamento popular face à democracia real. Os causadores desse desencantamento político não foram os fascistas, nem qualquer movimento de extrema-direita; foram sim os “democratas” corruptos, oportunistas, imorais, despidos de carácter os verdadeiros obreiros do desencantamento. A atracção pelo nacional-populismo parece-me ser maioritariamente a expressão do desejo popular de ter uma democracia melhor, mais autêntica. Mas é claro que a extrema-direita pretende manipular esse desejo popular sincero para assim conseguir impor o seu poder totalitário. E não faltarão deficientes morais carismáticos para instituir a grande criminalidade política.

Parece-me ser muitíssimo fácil determinar quem está a lucrar com a atitude de Ferro Rodrigues, pelo que não perco tempo com esse esclarecimento. Tentar demonstrar uma evidência é esforço inglório; por isso é que os matemáticos criaram os axiomas.

 

 

 

 

 

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Do Erro à Lição


 

Como defensor da Liberdade e da Igualdade causa-me incómoda estranheza não ter visto manifestar-se no hemiciclo da Assembleia da República uma imediata e clara condenação geral da muito infeliz atitude do Presidente da Assembleia ao tentar limitar a liberdade de escolha vocabular (não violadora das normas do uso educado de palavras) a um deputado da ala direita do Parlamento. O comportamento de Eduardo Ferro Rodrigues foi um completo infantilismo político, difícil de entender numa pessoa com tão grande experiência política. As declarações complementares, contidas na entrevista publicada na última edição do semanário Expresso, são ainda mais inaceitáveis à luz de elementares regras democráticas de funcionamento de um parlamento, como é o caso, desde logo, do preceito de isenção no exercício das funções de presidente. São erros graves que, por isso mesmo, convocam a urgência de uma reparação. É isso que se espera que venha a ser feito pelo digno presidente da Assembleia da República, segunda figura do Estado, e pela pessoa Eduardo Ferro Rodrigues, homem digno que ao longo de muitos anos de vida política deu constantes provas de rectidão.

Para além do erro e da esperada reparação do erro, há que retirar deste lamentável acontecimento uma lição fundamental: sempre que se transforma um adversário político-partidário num inimigo deteriora-se a qualidade da relação política, no plano pessoal e institucional, polariza-se a conflitualidade e escancara-se a porta ao autoritarismo ou ao totalitarismo que não deixarão de avançar pelo caminho aberto.

Espero que o erro que hoje aqui me trouxe à escrita desagúe celeremente na aprendizagem da lição.

João Maria de Freitas Branco

Caxias, 17 de Dezembro de 2019

 

 

 

 

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Ensinamentos da história para combater o totalitarismo

 

O ininterrupto combate político-cultural contra o totalitarismo, entendido como designativo genérico de todo o tipo de organização do viver humano colectivo que promova a extinção da Liberdade e Igualdade, esse combate, antitotalitário, atravessa neste momento uma fase de acelerado aumento de intensidade. Para que a acção dos tutores da Liberdade seja consequente, tanto no plano teórico como prático, entendo ser necessário assimilar dois ensinamentos essenciais legados pela história recente: 1) desde a queda do muro de Berlim, em 1989, os agentes do totalitarismo alteraram o método de intervenção; 2) o militantismo de agitação e propaganda (característico do antifascismo novecentista) não só perdeu eficácia como se tornou contraproducente, acabando por favorecer os interesses dos organizadores do totalitarismo.

O que se passou no Peru logo após o acontecimento que encerra o “breve século XX” (o fim do muro de Berlim), com a rápida ascensão ao poder de Alberto Fujimori no quadro de uma profunda crise económica, parece-me constituir um marco histórico que assinala a referida mudança metodológica. Já não foram os tanques nem os homens fardados empunhando armas que mataram a democracia. Já não era essa a forma mais conveniente e eficaz. Emergiu então uma forma de acção muito mais complexa, mais subtil, politicamente mais sofisticada. Tem ela a enorme vantagem de parecer ser inofensiva para a Liberdade e legítima, principalmente num momento de colapso económico com profundas consequências sociais, como se verificou no final da década de 1980, durante a presidência de Alan García. Esse novo método permitiu subverter a democracia peruana sob a bela capa de uma legalidade democrática. É a demolição aparentemente democrática da democracia. Uma forma “limpa”, por oposição à forma “suja” característica do que era o tradicional golpismo militarista. Tem a acrescida vantagem de ser um processo gradual, e por isso menos visível, mas que não deixa de ser célere. No caso peruano, bastou pouco mais de um ano para que um cidadão pouco conhecido, um académico de ascendência japonesa, se tornasse ditador, tendo derrotado um adversário que era celebridade mundial: o aclamado escritor Mario Vargas Llosa. No dia 5 de Abril de 1992 Alberto Fujimori pôde anunciar publicamente a dissolução do Congresso e a anulação da Constituição. A democracia peruana estava destruída por efeito de uma acção urdida na penumbra sob a máscara de uma normal legalidade democrática. A essa invisibilidade não foram nada estranhos alguns personagens também eles inicialmente bastante pouco visíveis, com destaque para Vladimiro Montesinos, um consultor presidencial que era (e ainda é) um perigoso deficiente moral – personagem típico indispensável à construção e conservação do totalitarismo.

O que se está a passar neste preciso momento nos EUA e em outros países deste nosso mundo deve ser seriamente pensado à luz dos ensinamentos históricos legados pela transformação do modelo táctico que o citado caso peruano exemplifica de forma modelar. Isso contribuirá para o assumir da consciência plena da ameaça real que paira sobre nós.

Quanto ao segundo ensinamento, limito-me a chamar a atenção para o seguinte: a atitude costumada de agredir com rótulos, de arremessar acusações insultuosas, de exibir indignação irritada, de baldear ódio equivalente ao que os adversários/inimigos políticos utilizam contra nós, não é, ao que me parece, a forma mais inteligente de combater quem contribui, consciente ou inconscientemente, para a extinção da Liberdade. A polarização odiosa favorece o inimigo da Liberdade. Não é por acaso que Donald J. Trump a alimenta diariamente, deslegitimando e demonizando os seus críticos ou opositores. Em vez disso, e se não me equivoco, o que o amante da Liberdade tem que fazer, já e sempre, é intervir pedagogicamente, utilizando os ensinamentos da história para dar a ver os perigos latentes resultantes da mudança metodológica, da transformação estratégico-táctica associada à nova acção dos amantes do totalitarismo.

João Maria de Freitas Branco

Caxias, 6 de Dezembro de 2019