Pesquisar neste blogue

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Uso da palavra "talvez"

 Ainda no âmbito da polémica surgida em torno do convite endereçado pela Câmara de Oeiras a Mario Vargas Llosa.


Texto

 

Mais uma questão interessante surgida neste debate do Facebook: o “talvez”; o uso desta palavra e o seu valor. No discurso, oral e escrito, recorro com frequência ao “talvez”; estranho seria que assim não fosse, dado o meu vínculo profissional com a Filosofia. No entanto, parece-me importante fazer notar que o “talvez” filosófico não implica nem promove, no domínio da ideologia bem com no da prática social concreta, a neutralidade, a indiferença, o amorfismo, a apatia, a existência invertebrada. As limitações cognitivas que convocam o uso do termo em nada desautorizam – numa outra esfera, a do humano existir social – o tomar partido, o ter convicções sólidas, o ter espinha, o assumir da responsabilidade cívica (ético-política) de decidir o que se apoia e o que se combate, o que se afirma e o que se nega, o que é aceitável e o que é inaceitável (exigindo resistência, impondo o faire face, como dizem os franceses). Aí reside o ponto de apoio antidogmático para o arquitectar do pensamento e da acção consequentes.

João Maria de Freitas Branco
Novembro de 2021

 

 

 


sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Vargas Llosa em Oeiras

 

Vargas Llosa convidado para discursar em Oeiras
Intervenção numa polémica do Facebook

No final do passado mês de Outubro apareceu num órgão de comunicação social a notícia de que Mario Vargas Llosa tinha sido convidado pela Câmara Municipal de Oeiras para participar na Bienal Internacional de Poesia de Oeiras. O tema da comunicação é “Poder e Democracia” e «o evento  insere-se na candidatura da cidade [sic] a Capital Europeia da Cultura 2027», informa o jornal.  Esta notícia foi partilhada nas redes sociais, suscitando polémica. Veja-se a página de Maria Isabel Santos Isidoro no Facebook (publicação do dia 30 de Outubro). Transponho agora para este blog os textos com que intervim nessa polémica. 

 

A Maria Isabel trouxe para aqui [Facebook] um tema interessante, activando a minha vontade de também sobre ele opinar.

As obras de arte, principalmente quando são obras maiores, adquirem vida própria, afastando-se da margem do espaço biográfico dos seus criadores. O facto de Michelangelo Merisi da Caravaggio ter assassinado uma pessoa não belisca a sua obra artística, em nada adelgaça a grandeza de “Os Batoteiros” ou de “Judite e Holofernes”, malgré le thème… Não seria culturalmente aceitável proibir a exposição pública deste quadro com a justificação de ser assassinato pintado por assassino, espécie de elogio pictórico do assassinamento. Receio, todavia, que por aí circulem sujeitos disponíveis para considerar que o óleo de Caravaggio é um despudorado incentivo à violência e por isso merecedor de censura. E se o artista-assassino Michelangelo Merisi da Caravaggio viesse à nossa terra para dizer publicamente o que pensa sobre este mundo? Devíamos ir ouvi-lo ou devíamos ficar em casa? Que seria mais enriquecedor para nós? Ir escutá-lo e conhecê-lo, ou não ir? Se decidíssemos ir, estaríamos coagidos a aplaudir? Não podíamos manifestar discordância ou até apupá-lo em função do que dissesse ou não dissesse?

Para meu sincero desgosto, o Autor de “La cuidad y los perros” e de “Conversación en la catedral” tornou-se confesso admirador do neoliberalismo, do capitalismo neoliberal a que já alguns, como Noam Chomsky, Marv Waterstone e Henry Giroux, chamaram capitalismo mafioso (denominação que aprovo). A minha já longa vida pública (como autor, intelectual, activista político, etc.) talvez me dispense de declarar quão profunda é a discordância política que tenho com o agora cidadão espanhol Mario Vargas Llosa que contradiz o primeiro Mario Vargas Llosa, esse que, até perto dos anos 1970, se confessava socialista e admirador da Revolução cubana. (A Maria Isabel Santos Isidoro e o Rui Capão já aqui referiram de forma clara a vergonhosa simpatia de Llosa pela sórdida política económica da ditadura de Pinochet, no Chile; está dito o essencial, pelo que nada acrescento neste contexto.)

No entanto, lendo com gosto e proveito o seu último romance, “Tempos duros” (ed. portuguesa da Quetzal), fico com a sensação de não estar ideologicamente apartado do Escritor, ou, talvez melhor, do conteúdo político da sua escrita ficcional. Não é pouco; talvez isso já justifique uma ida, mesmo que ela implique manifestar discordância, mesmo que ela exija vaia. Podemos conversar, discutir, polemicar com quem discordamos, mesmo que muito. Quanto menos idiota for esse outro, de quem politicamente discordamos, mais esse diálogo se justifica, podendo ser desejável, útil ou até mesmo necessário (no processo do confronto de ideias, bem como no da clarificação das ideias).

A vida ensinou-me quanto é valiosa a proximidade de seres humanos invulgares. Quem foi capaz de escrever romances como “La cuidad y los perros”, “Conversación en la catedral” e o recente “Tiempos recios” não é um sujeito vulgar; não me parece dever ser desmerecedor da nossa atenção. É apenas um dos maiores escritores vivos.

Como talvez alguns saibam, sou membro do Conselho Geral de Oeiras 27. No entanto, nessa minha qualidade, não me foi dado conhecimento da intenção de convidar Mario Vargas Llosa, nem sequer recebi comunicação formal relativa ao convite endereçado ao Escritor. Não tenho, por isso, qualquer responsabilidade no convite que foi feito no âmbito da candidatura oeirense a Capital Europeia da Cultura (Oeiras27). Não foi pedido conselho ao Conselho Geral. Strange, isn’t it?

João Maria de Freitas Branco
Facebook, 31 de Outubro de 2021

NOTA: Um outro texto relacionado com o tema, sobre o uso da palavra "talvez", será inserido isoladamente, em nova publicação.  




 

 

 

 

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Eutanásia aprovada

 A Assembleia da República está de parabéns pelo magnífico trabalho realizado sobre a eutanásia e que hoje culminou com a votação da alteração à lei de despenalização da morte assistida. Lei aprovada!

Um voto pela Liberdade, um passo em frente da e na Civilização.

João Maria de Freitas Branco
Caxias, 5 de Novembro de 2021