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terça-feira, 16 de abril de 2019

Notre-Dame


«Tous les yeux s’étaient levés vers le haut de l’église. Ce qu’ils voyaient était extraordinaire; sur le sommet de la galerie la plus élevée, plus haut que la rosace centrale, il y avait une grande flamme qui montait, qui montait […] Il se fit un silence de terreur.»

Palavras com duzentos anos esculpidas pelo punho de Victor Hugo e que estranhamente dizem a actualidade. Também as imagens de ontem vistas por meus olhos incrédulos me pareceram de um outro tempo, um tempo recuado, como que saídas de uma pintura antiga que talvez se chamasse “o incêndio da civilização”. No entanto, eram bem actuais, reais…

Paris n’est plus qu’un cri: Notre-Dame brûle! Notre-Dame brûle!
João Maria de Freitas-Branco
16 de Abril de 2019

quinta-feira, 11 de abril de 2019

Para uma reflexão


No seguimento do texto publicado ontem no Facebook e aqui no blog RAZÃO dou agora conhecimento de um episódio ocorrido na comunicação social francesa e que me parece merecedor de alguma reflexão.

Durante um telejornal ontem difundido, um jornalista do canal televisivo France2 entrevistou uma jovem astrofísica expressamente convidada para comentar o extraordinário acontecimento científico que marcou o dia – a captação pelo Event Horizon Telescope (EHT) da primeira imagem real de um buraco negro – e no final da entrevista perguntou à cientista se o buraco negro agora avistado não constituía um risco para os seres humanos, bem como para o nosso planeta Terra. A astrofísica conseguiu conter-se e respondeu mantendo uma expressão de seriedade. Mas ficámos a saber que um jornalista internacional de um grande canal de televisão pode não fazer a menor ideia do que é a distância que nos separa da galáxia Messier 87 (geralmente referida abreviadamente como M87, mas também conhecida por Virgo A ou NGC 4486). Situado no núcleo desta galáxia supergigante, o buraco negro está a uma distância de 53 milhões de anos-luz (55 milhões segundo o comunicado ontem publicado no site do EHT). Trata-se de facto de um buraco negro colossal que ainda há bem pouco tempo se supunha não poder existir no Cosmos. A realidade revela-se continuamente mais rica do que a nossa melhor imaginação… Mas mesmo tendo essa incrível dimensão (um diâmetro de 38 biliões de quilómetros e uma massa correspondente à de 6.5 biliões de estrelas como o Sol), não deixa de ser uma coisa muito pequenina se comparada com o espaço intergaláctico entre a nossa Via Láctea e a M87. Além disso, a imagem captada representa o buraco negro central da M87 tal como ele era há 53 milhões de anos ou mais. É uma realidade do passado e não do presente. Sendo que se pudessem existir efeitos nocivos graves projectados a tão grande distância eles, obviamente, chegariam também, na melhor das hipóteses, com esse mesmo atraso de 53 milhões de anos. A questão é ser também absurdo supor que o facto da captação da imagem ia desencadear subitamente, como que por acto de pura magia, efeitos ameaçadores. A luz proveniente do horizonte de eventos do buraco negro, naquela zona central da distante galáxia elíptica M87, há muito que está a banhar o nosso Planeta, mas só agora foi captada por extraordinário mérito da Ciência e da Técnica.

Se um jornalista internacional de um destacado canal francês de televisão exibe tão grande ignorância sobre o Universo em que vivemos, como é que a notícia científica terá sido recepcionada pela generalidade dos seres humanos? Não duvido que haja neste momento na Internet muitas vozes a dizer que a imagem divulgada é a do gigantesco olho negro de uma entidade sobrenatural mefistofélica que nos está a vigiar com o objectivo de destruir a Terra e os seus humanos habitantes. Ou então que é o olho do Deus redentor. E até talvez haja quem faça uma leitura maçónica da imagem cósmica, atribuindo-lhe uma simbologia secreta inscrita nos confins do Universo e pairando desde o início do tempo.

Algo parece estar a falhar na Escola, principalmente nos países que estão no topo da civilização, como é o caso da França. Como sempre, convém reflectirmos com profundidade, fazendo bom uso da Razão.

João Maria de Freitas-Branco
Caxias, 11 de Abril de 2019

quarta-feira, 10 de abril de 2019

Buraco negro


 

Mais um acontecimento histórico. Novo grande triunfo da Ciência. Um acontecimento merecedor da nossa melhor atenção: a primeira observação directa de um buraco negro.

Até o dia de hoje, sempre que alguém (mesmo que fosse um astrofísico) falava de buraco negro estava a referir-se a algo que nunca tinha visto. Só hoje, dia 10 de Abril de 2019, é que os seres humanos tiveram acesso a uma primeira imagem real de um buraco negro – imagem paradoxal, considerando que por definição um buraco negro não se pode observar (e até nem é um buraco…).

Acima de tudo, quero aqui saudar este grande acontecimento, expressando o meu completo entusiasmo.

Acontece, porém, que ao longo das últimas horas tenho verificado estarem a ser veiculadas, pela nossa comunicação social, informações erradas sobre este primeiro buraco negro directamente observado pelos humanos. O que me deixou mais alarmado e perplexo foi a intervenção de um especialista, Rui Agostinho, num dos noticiários da RTP3. Receando que essa informação errada volte a ser inserida no espaço informativo, nomeadamente no jornal nacional das 20h, tomo a iniciativa de recomendar que utilizem as melhores fontes, ou seja, as de natureza puramente científica e em que intervêm os cientistas responsáveis pela captação da histórica imagem. Sugiro as seguintes: 1) a edição especial do Astrophysical Journal Letters; 2) uma das seis conferências de imprensa realizadas simultaneamente em vários pontos do globo (registo integral online, CBC News).

Adianto já uma correcção: o buraco negro observado situa-se no “coração”, no núcleo da galáxia M87 e não no centro da nossa galáxia. A comparação feita (na RTP3) com a massa ou com a força gravitacional do Sol também está completamente errada.

A Teoria da Relatividade Geral volta a ser comprovada experimentalmente. O grande Albert volta a estar de parabéns.

Renovada homenagem pessoal a essa enorme figura da história do conhecimento humano.
João Maria de Freitas-Branco
10 de Abril de 2019
Publicado inicialmente no Facebook, às 18h:30