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terça-feira, 12 de novembro de 2013

Álvaro Cunhal em debate


Ando pouco por estas ruelas virtuais da modernice facebookeira, sem que esse relativo distanciamento represente desestimação por este meio informático disponibilizado pelo progresso tecnológico, antes pelo contrário. Apenas temo a dispersão que possa gerar -- factor inimigo do autêntico filosofar, por mim obrigatoriamente estimado. Só que desta vez, na minha breve passagem por aqui, topei a discordância entre dois distintos Amigos: o Eduardo e o Mário. O Eduardo Cintra Torres e o Mário Carvalho. Essa real, e já não virtual, proximidade afectiva que, confesso, se estende ao objecto da vossa desinteligência, acende em mim a vontade de meter a colher, opinando também. Será que posso? Supondo dada a permissão, salto para dentro da vossa controvérsia por me apetecer dizer-vos duas coisas que são, no fundo, duas confissões que talvez venham a propósito no centenário de Cunhal agora em comemoração. Primeira: lembram-se do livro “O Partido com paredes de vidro”? Quando foi publicado, no Verão de 1985, o mundo ainda estava dividido, física e simbolicamente, por um muro situado (cravado) no coração da Alemanha. Não sei se o leram. Mas se o fizeram, adivinho que o acto de leitura tenha ocorrido do lado ocidental do citado muro. Tal não foi o meu caso. Li-o do lado de lá. Do outro lado, o lado leste, dessa histórica divisória do mundo. E li-o com genuíno entusiasmo, como ainda hoje se pode perceber olhando para o tipo de anotação que fui inscrevendo nas páginas do meu exemplar. Sabem o porquê desse entusiasmo? É que essa obra era completamente subversiva naquele contexto nacional, no seio daquele país germânico entretanto desaparecido sob os escombros do dito muro de má memória, também dito “da vergonha”. Não exagero na terminologia, acreditem. Era prosa subversiva, é a exacta adjectivação, por mais que vos possa causar espanto. O livro só não foi objecto de censura devido ao nome que transportava na capa. O nome do autor tinha demasiado peso para que tal fosse possível. Pois é, meus caros Amigos. Não constituirá isto, por si só, prova inequívoca de uma discordância cunhalista em relação ao socialismo real? Como combinar esse sério olhar crítico de um homem singularmente inteligente, sensível e politicamente perspicaz com frases como a do “Sol da Terra”, por vós referida? Se não erro, isso torna a coisa ainda mais interessante e, por isso mesmo, digna de atenção de estudioso, concorrendo do mesmo passo para tornar ainda mais insuportável o sempre medíocre discurso simplista, ou simplificador, monotonamente gerado ora pelas inesgotáveis fontes do anticomunismo primário, ora pelas não menos inesgotáveis do proselitismo comunista, correntes que no fundo se irmanam, desaguando na torrente comum da superficialidade, do barbarismo, da mediocridade, da desonestidade intelectuais. O José Pacheco Pereira tem dado nobre exemplo de atitude de sinal contrário; ou seja, de elevação intelectual. E desse modo tem posto em evidência uma interessantíssima complexidade. Se não formos capazes de assimilar essa complexidade, nada conseguiremos perceber sobre a figura histórica, sobre o seu pensamento e acção. Segunda coisa. Segunda confissão. A vida é feita de cruzamentos interpessoais, natural efeito da natureza social do bicho humano. E nesse constante jogo de cruzamentos s de variegada índole sempre desejei, desejo e desejarei encontrar no meu caminho pessoas (note-se que nem todos os humanos chegam a adquirir o estatuto de pessoa) pessoas como esse Álvaro que está na origem da vossa discórdia actual, de Facebook. Porquê? Por serem pessoa extraordinária. No sentido literal do termo, sem encómio, sem intensão panegírica. Ou seja, o serem extra-ordinários, não vulgares. Álvaro Cunhal era desde logo isso mesmo, a negação da vulgaridade. Por isso, jamais conseguia passar despercebido no meio de uma multidão – exceptuando os casos em que, por imperativo de clandestinidade ou outro qualquer, recorria ao disfarce. Renovada prova da veracidade do meu dizer sobre a singularidade da sua presença social. E quem isto vos confessa guarda privilégio de que nem o principal biógrafo, o historiador, dedicado e competente estudioso, José Pacheco Pereira, se pode vangloriar: o de ter podido conhecer pessoalmente, e razoavelmente bem, a pessoa singular que aos três aqui nos trouxe ao diálogo.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Ser intelectual e combater a confusão


Há assuntos sobre os quais nem sequer me passa pela cabeça escrever e sobre os quais tenho o hábito de nada ler. Mantendo-me fiel a esta atitude de vida, não posso, porém, permanecer indiferente à actual enxurrada de manchetes espalhadas por todos os órgãos de comunicação, com excepção do jornal Público. O acontecimento motivador de tal celeuma pertencente àquela esfera de conteúdos que a imprensa cor-de-rosa designa por “vida dos famosos”, “lado negro da vida dos famosos”, “a vida íntima dos famosos”. Expressões que só por si me impelem a higiénica fuga. Mas não quero com isto dizer estar contra a opção editorial de órgãos de comunicação de referência como o Expresso, o DN ou a Visão. Muito pelo contrário. Para mais quando no caso vertente existe alegado comportamento criminoso protagonizado por figura pública que não se inibiu de trazer para a ribalta a sua própria vida privada, tornando-a, portanto, necessariamente pública. A este propósito a revista Visão enunciou uma pertinente interrogativa: «até onde é legítimo alguém usar a sua privacidade para se promover social e politicamente?»

Neste caso, o que para já me impede de ficar em silêncio é tão só a confusão que mais uma vez vejo triunfar na nossa hodierna sociedade e o meu militante desejo de lhe oferecer resistência intelectual. Como sabem os que têm a generosidade de ler o que escrevo, tenho desenvolvido o conceito de confusão alertando para a sua função ideológica e histórica (v. o meu ensaio, consultável neste blog, intitulado “Racionalidade: confusão e anticonfusão”). Vivemos mergulhados na confusão. Habitamos um mundo confuso. E a confusão é inimiga da Liberdade; ela semeia dependências. Daí a necessidade inalienável de investir em esforço de dilucidação. É isso o que aqui faço.

Nos referidos trabalhos jornalísticos tenho visto sistematicamente associadas duas coisas que jamais podem coabitar no mesmo ser humano, uma vez que se excluem mutuamente. Refiro-me ao carácter e à condição de intelectual. Dizer de uma pessoa que é um “intelectual reputado” e ao mesmo tempo pôr em evidência a sua falta de carácter é espalhar confusão.

Superemos então o estado de confusão e clarifiquemos.

Qual a primeira condição para se ser um intelectual? A principal condição para que alguém possa ser considerado um intelectual é o carácter. Quem não tiver carácter não é nem pode ser um autêntico intelectual. Pouco ou nada importa que exiba títulos universitários ou bibliografia pessoal. Sem carácter não se é intelectual verdadeiro. Tenho dito.

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Entrevista

Dei uma entrevista ao jornal PÚBLICO que foi dada à estampa na edição do passado Domingo, dia 3 de Novembro. A entrevista foi conduzida pelos jornalistas São José Almeida e Nuno Ribeiro. Aqui fica o texto introdutório, da responsabilidade dos citados jornalistas.


Entrevista
João Maria de Freitas-Branco

"Toda a representatividade tem que ser repensada e alterada" e o actual sistema eleitoral tem de mudar, pois induz os revoltados à abstenção, defende o filósofo, que propõe a criação de "partidos temporários". De esquerda, embora ache indispensável haver expressão à direita, considera que se vive em "semidemocracia", já que as eleições estão transformadas em "farsa", pois o Governo não cumpre o programa eleitoral e não respeita a Constituição.
Filósofo, autor, professor e investigador universitário, João Maria de Freitas-Branco é um dos fundadores do Movimento para a Democratização do Regime. Considera que se vivem tempos em que a velocidade das mudanças ultrapassa a capacidade cognitiva do ser humano, mas defende que "continua a ser uma obrigação da esquerda cumprir o programa iluminista. Perante uma sociedade em que alastra "uma espantosa banalização da imoralidade", sublinha que "o fundamento da necessidade de defender o Estado social radica no conceito darwinista de simpatia".

Texto completo da entrevista no site do PÚBLICO.
Também pode ser solicitado através de mensagem na página de João Maria de Freitas-Branco no Facebook. Será enviado aos interessados ficheiro pdf.

«Estamos a viver uma revolução tão profunda como a do neolítico»
JMFB

Jornal PÚBLICO, edição de 3 de Novembro de 2013, 1ª página e pp.14, 15 e 16.