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segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Rescaldo de uma jornada eleitoral

 

Deixo aqui um conjunto de breves impressões pessoais dos resultados de ontem. Carecem, por certo, de ponderação mais cuidada.

Para quem se situa na ala mais à esquerda, no espectro político nacional, o acto eleitoral de ontem traduziu-se no alcançar de um primeiro objectivo essencial: a reedição de uma maioria parlamentar norteada pelos valores da esquerda. No seu conjunto, PS, PCP, BE, Livre têm 129 deputados no hemiciclo (e vão ter mais). Uma confortável maioria absoluta que não deixa dúvidas quanto à inclinação política dos cidadãos portugueses.

Porém, o segundo objectivo principal não foi alcançado: o reforço da esquerda parlamentar anticapitalista (PCP e BE). Essa ala é um factor essencial para a vitalidade do nosso Estado de direito democrático. No entanto, nestas eleições, sofreu pesadíssima derrota que convoca cuidada reflexão crítica e autocrítica. A representação desta ala anticapitalista perdeu 20 dos 31 deputados que tinha! A extrema-direita passa a ter mais um deputado do que a soma dos deputados do PCP e do BE. O PCP teve a maior derrota eleitoral de sempre.

Como ontem escrevia o Francisco Assunção, antigo jornalista de O Diário e da Lusa, os erros tácticos do PCP e do BE «entram pelos olhos dentro». Resta saber se vai haver vontade de os reconhecer. Uma coisa é errar, outra é persistir no erro, replicando os mesmos desacertos. Algumas declarações das últimas horas fazem temer a revitalização da mentalidade espelhada na velha máxima: de derrota em derrota até à vitória final.

Outra derrota, com peso histórico, foi a que ditou o afastamento do CDS do hemiciclo. Trata-se de uma derrota da Democracia, e não apenas de um partido. A presença da democracia cristã na AR foi, desde a fundação da II República, um factor de enriquecimento do regime e da vida política nacional. Afirmo-o, sem hesitação e na óptica de uma esquerda antidogmática, dialéctico-racionalista, que é a minha. Pode soar como contradição na cabeça de alguns, mas não é, desde que haja inteligência antidogmática. Espero que o CDS, com a sua matriz democrata cristã original, esteja de regresso na próxima legislatura. Terá (com o actual PSD) papel relevante no combate à extrema-direita populista e antidemocrática.

Sinal de alerta: pela primeira vez desde Abril de 1974 há um grupo parlamentar inimigo do sistema democrático. Um partido de extrema-direita fascistóide, imoral, naturalmente antidemocrático, xenófobo e racista obteve 12 lugares no Parlamento. Nenhum democrata pode ficar indiferente.

Saúda-se o facto de o Livre, depois de um triste percalço e sendo representante de uma nova vertente da esquerda, que se autodenomina ecologista e europeísta, ter conseguido reeditar o bom resultado eleitoral de 2019. Aproveito para, publicamente, dar os parabéns ao Rui Tavares pela sua eleição como deputado da AR. Porque o conheço, sei que a sua presença no hemiciclo concorrerá para prestigiar o Parlamento.

João Maria de Freitas Branco
Caxias, 31 de Janeiro de 2022

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