Nunca pensei que a leitura de um texto redigido por um
ministro das finanças me pudesse despertar sentimento de verdadeira felicidade,
me pudesse empolgar e até comover. Mas aconteceu. Foi quando há poucos
instantes li o artigo de Yanis Varoufakis publicado no New York Times e que me foi enviado, já traduzido, pelo meu
esplêndido Amigo António Gomes Marques. Aqui o deixo agora aos meus amigos do Facebook
na esperança que sintam o que eu senti: satisfação, entusiasmo, comoção,
admiração. Sinto-me cada vez mais SYRIZA. Será que um cidadão português se pode
inscrever neste partido grego? Sugiro à Direcção do Syriza que crie a
possibilidade estatutária de acolher a inscrição de membros-simpatizantes de
todas as nacionalidades, com cotização voluntária. Julgo que seria uma boa
forma de financiamento. Estou em crer que, como eu, existam milhares de
cidadãos europeus desejosos de acudir ao Syriza, porque ajudar essa audaz força
política é ajudar a salvar a Europa, a União Europeia solidária, progressista,
civilizadora. É a solução racional do grande Imannuel Kant!, tão oportunamente
referenciado por Yanis Varoufakis, cujo artigo total e entusiasticamente
subscrevo. Quando é que na minha Pátria poderei aplaudir um ministro das
finanças com o entusiasmo com que hoje aplaudo este lúcido grego? Um ministro
das finanças com cultura filosófica, que lê e admira o Kant! Obrigado Yanis, e
coragem!
Viva o SYRIZA!
João Maria de Freitas-Branco
18 de Fevereiro de 2015
ARTIGO DO NEW YORK TIMES:
Não há tempo para jogos na Europa
ATENAS— Escrevo este artigo à margem
de uma negociação crucial com os credores do meu país — uma negociação cujo
resultado poderá marcar uma geração, e tornar-se mesmo um ponto de viragem
quanto aos efeitos da experiência da Europa com a união monetária.
Teóricos dos jogos analisam
negociações como se elas fossem jogos de divisão de bolos em que participam
jogadores egoístas. Por ter, na minha vida anterior, na qualidade de académico,
estudado durante muitos anos a Teoria dos Jogos, alguns comentadores
precipitaram-se a concluir que, na qualidade de ministro das Finanças grego,
estava a conceber bluffs, estratagemas e outras opções, tentando obter
uma posição de vantagem apesar de dispor de um jogo fraco.
Quando muito, o meu passado de
Teoria dos Jogos convenceu-me de que seria uma completa loucura pensar nas
actuais deliberações entre a Grécia e os nossos parceiros como um jogo de
regateio a ser ganho ou perdido através de bluffs e subterfúgios
tácticos.
O problema da Teoria dos Jogos, como
eu costumava contar aos meus alunos, é o de assumir como dado adquirido os
motivos dos jogadores. No poker ou no blackjack, esta premissa não é
problemática. Contudo, nas actuais deliberações entre os nossos parceiros
europeus e o novo governo grego, aquilo que se pretende no fim de contas é
forjar novos motivos. Criar uma nova mentalidade que transcenda divisões
nacionais, dilua a distinção credor-devedor em prol de uma perspectiva pan-europeia
e que ponha o bem comum europeu acima da mesquinhez política, dogma nocivo se
generalizado, e da mentalidade nós-contra-eles.
Como ministro das Finanças de uma
pequena nação, com enormes restrições orçamentais, sem um banco central próprio
e vista por muitos dos nossos parceiros como devedor problemático, estou
convencido de que temos uma única opção: afastar qualquer tentação de tratar
este momento decisivo como um ensaio estratégico e, em vez disso, apresentar
honestamente os factos da economia social grega, apresentar as nossas propostas
para que a Grécia volte a crescer, explicando os motivos pelos quais elas são
do interesse da Europa, e revelar as linhas vermelhas que a lógica e o dever
nos impedem de ultrapassar.
A grande diferença entre este governo
grego e o anterior tem duas vertentes: estamos determinados a combater
interesses para dar um novo impulso à Grécia e conquistar a confiança dos
nossos parceiros e estamos determinados a não ser tratados como uma colónia
da dívida que deve sofrer aquilo que for necessário. O princípio da maior
austeridade para a economia mais deprimida seria pitoresco, se não causasse
tanto sofrimento desnecessário.
Frequentemente, perguntam-me: e se a
única forma de assegurar financiamento for ultrapassar as linhas vermelhas que
estabeleceu e aceitar medidas que considera serem parte do problema e não da
solução? Fiel ao princípio de que não tenho direito a fazer bluff, a
minha resposta é: as linhas vermelhas não serão ultrapassadas. De outra forma,
não seriam verdadeiramente vermelhas, seriam um mero bluff.
E se tudo isto trouxer muito
sofrimento ao seu povo? Perguntam-me. Está, certamente, a fazer bluff.
O problema desta linha argumentativa
é o de partir do princípio, de acordo com a Teoria dos Jogos, de que vivemos
numa tirania de consequências. Que não há circunstâncias nas quais devemos
fazer o que é correcto, não como estratégia, mas por ser…correcto.
Contra este cinismo, o novo governo
grego irá inovar. Iremos cessar, independentemente das consequências, acordos
que são errados para a Grécia e errados para a Europa. O jogo do “adiar e
fingir”, que começou depois de o serviço da dívida pública grega não poder ter
sido cumprido em 2010, vai acabar. Acabaram-se os empréstimos – pelo menos, até
termos um plano credível de crescimento da economia para pagar esses
empréstimos, ajudar a classe média a recuperar e resolver as terríveis crises
humanitárias. Acabaram-se os programas de “reforma” que se dirigem aos
pobres pensionistas e a farmácias familiares e mantém intocável a corrupção em
grande escala
O nosso governo não está a pedir aos
nossos parceiros uma solução para pagar as dívidas. Estamos a pedir alguns
meses de estabilidade financeira que nos permita criar reformas que uma extensa
camada da população grega possa assumir e apoiar, para podermos voltar a
ter crescimento e acabar com a nossa falta de capacidade de pagar as nossas
dívidas.
Pode pensar-se que esta retirada da
Teoria dos Jogos é motivada por uma qualquer agenda de esquerda radical. Nem
por isso. Aqui, a maior influência é Imannuel Kant, o filósofo alemão que nos
ensinou que a saída racional e livre do império da conveniência é fazer aquilo
que é correcto.
Como sabemos que a nossa modesta
agenda política, afinal de contas a nossa linha vermelha, em termos kantianos,
é a correcta? Sabemos, olhando nos olhos dos esfomeados nas ruas ou
contemplando a pressão sobre a nossa classe média, ou considerando os
interesses dos diligentes trabalhadores de cada aldeia, vila e cidade na nossa
união monetária. No fim de contas, a Europa só recuperará a sua alma quando
recuperar a confiança das pessoas, pondo os interesses delas na linha da
frente.
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