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segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Quando a informação devém diversão

Com tristeza, tenho assistido ao longo dos últimos dias à confusão, promovida pelos canais televisivos, entre o principal e o secundário. É ela mais um claro exemplo do grave fenómeno hodierno da metamorfose da informação em diversão. A prioridade é entreter quem está diante do ecrã. Refiro-me, como terão adivinhado, ao modo como o jornalismo televisivo abordou a greve geral de dia 14, a grande manifestação de rua que lhe esteve associada, as propostas concretas de uma política diferente, não austeritária, apresentadas pela CGTP, e o episódio final do apedrejamento de polícias levado a cabo por meia dúzia de imberbes energúmenos. Este episódio menor, ocorrido já depois do fim da manifestação e da jornada de greve, foi promovido à condição de acontecimento maior, tornando-se notícia principal e relegando para segundo plano a acção grevista de muitos milhares de trabalhadores, assim como o conteúdo da mensagem política apresentada pelos dirigentes sindicais, fundamentando os motivos do protesto nacional. O que devia ser prioritário conteúdo noticioso foi substituído por um atraente reality show televisivo, protagonizado pelos miúdos arruaceiros sistematicamente apelidados de “radicais” – por coincidência o mesmo termo adjectivante agora em uso para classificar determinados partidos políticos com assento parlamentar, como o PCP e o BE.

É a violência dada como espectáculo de TV. Que melhor pode haver para entreter o sujeito que olha para o ecrã sentado no sofá de sua casa? Um emocionante reality show, com baixos custos de produção, que para além do entretenimento que proporciona tem ainda a “virtude” ideológica de levar o desprotegido cidadão telespectador a supor que a verdadeira violência são aqueles actos de incendiar contentores do lixo, ou atirar calhaus, e não uma política governativa que extorque pensões e subsídios condenando seres humanos a viver com 300 ou 400 Euros mensais, retirando-lhes assim a possibilidade de manter uma vida digna. A grande Violência fica assim disfarçada por uma violência comparativamente insignificante.

Lamento que até os bons jornalistas/comentadores televisivos tenham embarcado nesta transformação da informação em mera diversão, parecendo ignorarem a gravidade desse fenómeno ensopado de ideologia que concorre para que o cidadão tenda a tornar-se um mero espectador passivo, um ser entretido, alguém que, divertido pelas imagens, se vai distanciando do acontecer real. É o assassinato do cidadão praticante. Em seu lugar é criado um sujeito social civicamente inactivo, passivo espectador entretido. E entretenimento gera, frequentemente, a distracção; pelo que, por efeito de uma realização televisiva e de critérios editoriais que metamorfoseiam a informação em diversão, o espectador, para gáudio do poder governamental, devém cidadão distraído. The show must go on? Não. Não tem, não deve, nem pode continuar.

João Maria de Freitas Branco

Artigo de opinião no jornal PÚBLICO

(Texto integral e com os sublinhados do autor)

2 comentários:

  1. Um "atraente reality show" elevado à qualidade de "ópio do povo"!Parabéns pelos alertas que nos fazes neste texto.O conceito de violência com o qual se fazem imensas confusões! É como se a violência de ser obrigado, pelas políticas governamentais, a passar fome apesar de ter contribuido a vida toda para a resolução da sua subsistência, não fosse violência!
    Outro conceito verdadeiramente transfigurado por uma comunicação superficial e pretensamente apolítica é o de radical. O que seria da humanidade se nunca tivesse existido radicalidade no pensamento, na ciência, na arte, na política....

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  2. Leva este debate para junto dos alunos e colegas profs. Obrigado pelo comentário.

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