A candidatura de António Sampaio
da Nóvoa é disso expressão maior, sendo portadora de sinais de esperança que
vão ocupando o espaço onde antes se tinha instalado o medo, o desânimo, a
resignação, a apatia – ingredientes favoráveis ao adormecimento do cidadão
praticante. Mas a candidatura vai mais além: ela é cativante também pela sua já
revelada capacidade de engendrar acontecimentos inesperados de nítida
proficuidade para o saneamento e elevação da actividade política no interior da
sociedade portuguesa. Deviam esses casos constituir notícia. Só que nem todas
as notícias são convenientes para quem detém o controlo dos principais órgãos
de comunicação social. Algumas são mesmo bastante inconvenientes. Tal é o caso
da que aqui desejo trazer à atenção e que me tem indisposto ver permanecer
ignorada.
Ei-la aqui: a nossa 2ª República é
fruto de admirável gesto libertador protagonizado por uma singular elite de militares
que integravam um exército colonial fascista. Coisa extraordinária, no plano
mundial, e, a meu ver, ainda não devidamente enaltecida pelos historiadores, de
cá ou de outras paragens. No abnegado esforço de construção da nova República
democrática esses generosos militares de Abril desuniram-se e conflituaram por
efeito dos diferentes modos de conceber a democracia. Sim, porque há várias
democracias. Uma diversidade que o discurso comum tende a ocultar, também por
conveniência ideológica. Há democracias que enfatizam a liberdade política ou negativa,
há as que valorizam mais a liberdade social, há as que apostam em ambas, sendo
que a democracia, tal como a liberdade que lhe está umbilicalmente associada,
pode determinar-se no domínio de diferentes modos de produção. O conflito de
visões do mundo era por isso (e não só por isso) uma espécie de inevitabilidade
histórica. No entanto, mesmo nos momentos de mais aguda desavença ideológica
tiveram esses heróicos militares revolucionários a digníssima atitude de nunca
se desrespeitarem mutuamente. Sou disso testemunha. Razão acrescida para a
enorme consideração que nutro por esses homens, alguns dos quais tiveram (os já
perecidos) e têm a acrescida generosidade de serem meus amigos, coisa que muito
me honra.
Muito embora mantendo esse
genuíno e sincero respeito mútuo, os militares de Abril mantiveram depois do
PREC e do 25 de Novembro de 1975 posições politicamente diferenciadas,
divergentes e até, em alguns casos, opostas.
Passaram quatro décadas. Chega
então mais um mês de Abril, o do ano acabado de findar, em que o cidadão
António Nóvoa, distinto académico e ex-reitor da Universidade de Lisboa, decide
candidatar-se ao cargo de Presidente da República. Não para ser o supremo
magistrado da Nação, senão que para ser o primeiro servidor da res publica, em total harmonia com o
melhor e mais puro espírito republicano. Uma candidatura de novo tipo, ditada
pelas urgências do presente. O nosso António Nóvoa passa a ser conhecido como
Sampaio da Nóvoa, candidato cidadão que quer, com o apoio da maioria dos portugueses,
livremente expresso nas urnas, tornar-se o primeiro presidente cidadão desta
República – por ser o primeiro sem dependências político-partidárias.
Repentinamente, nesse Abril de
2015 começa a verificar-se uma convergência inaudita desde 1975 entre os
capitães da liberdade. Facto novo! Semeado pela candidatura. Novidade muito
bem-vinda! Os militares de Abril reaproximam-se politicamente em torno da
iniciativa de Sampaio da Nóvoa. A única excepção que conheço confirma a regra,
observada no terreno da campanha eleitoral em curso e corroborada por
informação pessoal recolhida junto da Associação 25 de Abril. Pela primeira vez
após o 25 de Novembro os arquitectos militares da Liberdade unem-se para
travarem, outra vez em conjunto, uma batalha política eleitoral em defesa das
mesmas grandes causas de 1974, bem como de algumas outras trazidas pelos tempos
menos recuados.
Se não erro, trata-se de
acontecimento com relevância histórica. Algo que devia estar a ser amplamente
noticiado, sendo também merecedor da melhor atenção dos comentadores políticos,
dos politólogos, dos analistas sociais. Por que será então que esta ocorrência
não é notícia? Qual a razão do silêncio? Que motivará a indiferença dos
comentadores de serviço perante tão significativa convergência política?
Quero alimentar a esperança de
que este pequeno escrito possa concorrer para pôr em evidência a atitude,
trazendo para os espaços noticiosos de referência, bem como para a ribalta do
comentário político esta ocorrência muito indicativa: os militares de Abril
voltam a estar unidos numa batalha política; os militares da Liberdade apoiam
Sampaio da Nóvoa.
João Maria de Freitas-Branco
Caxias, 16 de Janeiro de 2016
Caxias, 16 de Janeiro de 2016
Originalmente publicado no blog PARA UM NOVO TEMPO snap2016.blogspot.com
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