Há assuntos sobre os quais nem sequer me passa pela cabeça
escrever e sobre os quais tenho o hábito de nada ler. Mantendo-me fiel a esta
atitude de vida, não posso, porém, permanecer indiferente à actual enxurrada de
manchetes espalhadas por todos os órgãos de comunicação, com excepção do jornal
Público. O acontecimento motivador de tal celeuma pertencente àquela esfera de conteúdos
que a imprensa cor-de-rosa designa por “vida dos famosos”, “lado negro da vida dos
famosos”, “a vida íntima dos famosos”. Expressões que só por si me impelem a
higiénica fuga. Mas não quero com isto dizer estar contra a opção editorial de
órgãos de comunicação de referência como o Expresso, o DN ou a Visão. Muito
pelo contrário. Para mais quando no caso vertente existe alegado comportamento
criminoso protagonizado por figura pública que não se inibiu de trazer para a
ribalta a sua própria vida privada, tornando-a, portanto, necessariamente pública.
A este propósito a revista Visão enunciou uma pertinente interrogativa: «até
onde é legítimo alguém usar a sua privacidade para se promover social e
politicamente?»
Neste caso, o que para já me impede de ficar em silêncio é tão
só a confusão que mais uma vez vejo triunfar na nossa hodierna sociedade e o
meu militante desejo de lhe oferecer resistência intelectual. Como sabem os que
têm a generosidade de ler o que escrevo, tenho desenvolvido o conceito de
confusão alertando para a sua função ideológica e histórica (v. o meu ensaio, consultável
neste blog, intitulado “Racionalidade: confusão e anticonfusão”). Vivemos
mergulhados na confusão. Habitamos um mundo confuso. E a confusão é inimiga da
Liberdade; ela semeia dependências. Daí a necessidade inalienável de investir
em esforço de dilucidação. É isso o que aqui faço.
Nos referidos trabalhos jornalísticos tenho visto
sistematicamente associadas duas coisas que jamais podem coabitar no mesmo ser
humano, uma vez que se excluem mutuamente. Refiro-me ao carácter e à condição
de intelectual. Dizer de uma pessoa que é um “intelectual reputado” e ao mesmo
tempo pôr em evidência a sua falta de carácter é espalhar confusão.
Superemos então o estado de confusão e clarifiquemos.
Qual a primeira condição para se ser um intelectual? A
principal condição para que alguém possa ser considerado um intelectual é o
carácter. Quem não tiver carácter não é nem pode ser um autêntico intelectual.
Pouco ou nada importa que exiba títulos universitários ou bibliografia pessoal.
Sem carácter não se é intelectual verdadeiro. Tenho dito.
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