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sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Ensinamentos da história para combater o totalitarismo

 

O ininterrupto combate político-cultural contra o totalitarismo, entendido como designativo genérico de todo o tipo de organização do viver humano colectivo que promova a extinção da Liberdade e Igualdade, esse combate, antitotalitário, atravessa neste momento uma fase de acelerado aumento de intensidade. Para que a acção dos tutores da Liberdade seja consequente, tanto no plano teórico como prático, entendo ser necessário assimilar dois ensinamentos essenciais legados pela história recente: 1) desde a queda do muro de Berlim, em 1989, os agentes do totalitarismo alteraram o método de intervenção; 2) o militantismo de agitação e propaganda (característico do antifascismo novecentista) não só perdeu eficácia como se tornou contraproducente, acabando por favorecer os interesses dos organizadores do totalitarismo.

O que se passou no Peru logo após o acontecimento que encerra o “breve século XX” (o fim do muro de Berlim), com a rápida ascensão ao poder de Alberto Fujimori no quadro de uma profunda crise económica, parece-me constituir um marco histórico que assinala a referida mudança metodológica. Já não foram os tanques nem os homens fardados empunhando armas que mataram a democracia. Já não era essa a forma mais conveniente e eficaz. Emergiu então uma forma de acção muito mais complexa, mais subtil, politicamente mais sofisticada. Tem ela a enorme vantagem de parecer ser inofensiva para a Liberdade e legítima, principalmente num momento de colapso económico com profundas consequências sociais, como se verificou no final da década de 1980, durante a presidência de Alan García. Esse novo método permitiu subverter a democracia peruana sob a bela capa de uma legalidade democrática. É a demolição aparentemente democrática da democracia. Uma forma “limpa”, por oposição à forma “suja” característica do que era o tradicional golpismo militarista. Tem a acrescida vantagem de ser um processo gradual, e por isso menos visível, mas que não deixa de ser célere. No caso peruano, bastou pouco mais de um ano para que um cidadão pouco conhecido, um académico de ascendência japonesa, se tornasse ditador, tendo derrotado um adversário que era celebridade mundial: o aclamado escritor Mario Vargas Llosa. No dia 5 de Abril de 1992 Alberto Fujimori pôde anunciar publicamente a dissolução do Congresso e a anulação da Constituição. A democracia peruana estava destruída por efeito de uma acção urdida na penumbra sob a máscara de uma normal legalidade democrática. A essa invisibilidade não foram nada estranhos alguns personagens também eles inicialmente bastante pouco visíveis, com destaque para Vladimiro Montesinos, um consultor presidencial que era (e ainda é) um perigoso deficiente moral – personagem típico indispensável à construção e conservação do totalitarismo.

O que se está a passar neste preciso momento nos EUA e em outros países deste nosso mundo deve ser seriamente pensado à luz dos ensinamentos históricos legados pela transformação do modelo táctico que o citado caso peruano exemplifica de forma modelar. Isso contribuirá para o assumir da consciência plena da ameaça real que paira sobre nós.

Quanto ao segundo ensinamento, limito-me a chamar a atenção para o seguinte: a atitude costumada de agredir com rótulos, de arremessar acusações insultuosas, de exibir indignação irritada, de baldear ódio equivalente ao que os adversários/inimigos políticos utilizam contra nós, não é, ao que me parece, a forma mais inteligente de combater quem contribui, consciente ou inconscientemente, para a extinção da Liberdade. A polarização odiosa favorece o inimigo da Liberdade. Não é por acaso que Donald J. Trump a alimenta diariamente, deslegitimando e demonizando os seus críticos ou opositores. Em vez disso, e se não me equivoco, o que o amante da Liberdade tem que fazer, já e sempre, é intervir pedagogicamente, utilizando os ensinamentos da história para dar a ver os perigos latentes resultantes da mudança metodológica, da transformação estratégico-táctica associada à nova acção dos amantes do totalitarismo.

João Maria de Freitas Branco

Caxias, 6 de Dezembro de 2019

 

 

 

1 comentário:

  1. Tive de roubar este texto, principalmente pelo último parágrafo. Vou digeri-lo e redistribui-lo ... com créditos ;-)

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