No seguimento do texto publicado ontem no Facebook e aqui no
blog RAZÃO dou agora conhecimento de um episódio
ocorrido na comunicação social francesa e que me parece merecedor de alguma
reflexão.
Durante um telejornal ontem difundido, um jornalista do canal
televisivo France2 entrevistou uma jovem astrofísica expressamente convidada
para comentar o extraordinário acontecimento científico que marcou o dia – a
captação pelo Event Horizon Telescope (EHT) da primeira imagem real de um
buraco negro – e no final da entrevista perguntou à cientista se o buraco negro
agora avistado não constituía um risco para os seres humanos, bem como para o
nosso planeta Terra. A astrofísica conseguiu conter-se e respondeu mantendo uma
expressão de seriedade. Mas ficámos a saber que um jornalista internacional de
um grande canal de televisão pode não fazer a menor ideia do que é a distância que
nos separa da galáxia Messier 87 (geralmente referida abreviadamente como M87,
mas também conhecida por Virgo A ou NGC 4486). Situado no núcleo desta galáxia
supergigante, o buraco negro está a uma distância de 53 milhões de anos-luz (55
milhões segundo o comunicado ontem publicado no site do EHT). Trata-se de facto
de um buraco negro colossal que ainda há bem pouco tempo se supunha não poder
existir no Cosmos. A realidade revela-se continuamente mais rica do que a nossa
melhor imaginação… Mas mesmo tendo essa incrível dimensão (um diâmetro de 38
biliões de quilómetros e uma massa correspondente à de 6.5 biliões de estrelas
como o Sol), não deixa de ser uma coisa muito pequenina se comparada com o espaço
intergaláctico entre a nossa Via Láctea e a M87. Além disso, a imagem captada representa
o buraco negro central da M87 tal como ele era há 53 milhões de anos ou mais. É
uma realidade do passado e não do presente. Sendo que se pudessem existir
efeitos nocivos graves projectados a tão grande distância eles, obviamente,
chegariam também, na melhor das hipóteses, com esse mesmo atraso de 53 milhões
de anos. A questão é ser também absurdo supor que o facto da captação da imagem
ia desencadear subitamente, como que por acto de pura magia, efeitos
ameaçadores. A luz proveniente do horizonte de eventos do buraco negro, naquela
zona central da distante galáxia elíptica M87, há muito que está a banhar o
nosso Planeta, mas só agora foi captada por extraordinário mérito da Ciência e
da Técnica.
Se um jornalista internacional de um destacado canal francês
de televisão exibe tão grande ignorância sobre o Universo em que vivemos, como
é que a notícia científica terá sido recepcionada pela generalidade dos seres
humanos? Não duvido que haja neste momento na Internet muitas vozes a dizer que
a imagem divulgada é a do gigantesco olho negro de uma entidade sobrenatural mefistofélica
que nos está a vigiar com o objectivo de destruir a Terra e os seus humanos
habitantes. Ou então que é o olho do Deus redentor. E até talvez haja quem faça
uma leitura maçónica da imagem cósmica, atribuindo-lhe uma simbologia secreta inscrita
nos confins do Universo e pairando desde o início do tempo.
Algo parece estar a falhar na Escola, principalmente nos
países que estão no topo da civilização, como é o caso da França. Como sempre,
convém reflectirmos com profundidade, fazendo bom uso da Razão.
João Maria de Freitas-Branco
Caxias, 11 de Abril de 2019
Caxias, 11 de Abril de 2019
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