Novo movimento político de resistência
Tive ontem o grato prazer de, uma
vez mais na vida, participar directamente na criação de uma organização
política de utilidade cívica para a nossa grei, assumindo assim, na sã
companhia de ilustres companheiros e amigos, o estatuto de co-fundador do
Movimento para a Democratização do Regime (MDR). Todos esperamos que tenha bom futuro
e sirva o objectivo a que se propôs.
Para que se percebam os desígnios
dos fundadores, mas também com a preocupação de dissipar eventuais equívocos
resultantes do debate que antecedeu e preparou o gesto fundador de ontem, quero
aqui afirmar que não me passa, nem nunca me passou pela cabeça a ideia de que o
MDR, enquanto tal, se venha a transformar num partido político. Seria néscio
colocar sequer tal hipótese. Entendo, porém, que a extrema gravidade do momento
político que atravessamos impõe a urgência de agir no plano da disputa do poder,
oferecendo assim a necessária resistência àquilo que é, em Portugal, na última
meia centúria, a maior ofensiva contra o Estado social, tendo como consequência
um retrocesso civilizacional. Forças inimigas, internas e externas, daquilo a
que António Sérgio chamava a Democracia autêntica, e inimigas também do
progresso civilizacional fundado no programa iluminista já estão hoje no poder,
exercendo-o de uma forma imoral ou amoral. Isto impõe urgências. Sabem aqueles
que se esforçam por aprender com a História que as forças do totalitarismo
populista, sempre à espreita, não incorrem no vício da demora. A democracia
está gravemente enferma, necessitando de premente cuidar intensivo. Os actos eleitorais,
elemento basilar na determinação da chamada “vontade popular”, tornaram-se uma
completa fraude.
Deixo à consideração de todos, no
seguimento da opinião que sistematicamente tenho publicado através de artigos e
ensaios, os seguintes factos: a) a abstenção é maioritária em comparação com
qualquer escolha partidária; b) os votos brancos e nulos correspondem a uma
percentagem eleitoral muito superior à dos resultados obtidos pela maioria dos
partidos; c) a consideração do somatório da abstenção, dos votos brancos e dos
nulos impõe a conclusão de que a clara maioria dos cidadãos eleitores está
insatisfeita com a oferta e não se reconhece representada; d) o eleitor vota
sem a menor garantia de ver respeitada a vontade que expressa, dada a
inexistência de mecanismo eficaz impeditivo da discrepância de conteúdos entre
programa eleitoral e programa governamental executado; e) o partido que vence
as eleições representa uma magra minoria e, consequentemente, institui o governo
de uma minoria, subvertendo por completo um princípio básico da democracia: o
do primado da vontade maioritária; f) a descrença no sistema democrático é cada
vez mais profunda e ampla, deixando o cidadão menos imune a propostas não
democráticas, mais debilitado face a hipotéticas alternativas totalitárias.
Na minha óptica, este conjunto de
factos (bem como outros aqui não evocados), com as exuberantes evidências que
transporta impõe, a toda e qualquer organização política que se posicione na
barricada da resistência aos inimigos acima referidos (sejam eles os que já
estão no poder ou os que o espreitam munidos da poderosa arma do populismo
totalitário), impõe a urgência do combate pelo poder. O MDR não deve nem pode
colocar-se à margem desse combate instante. Deve estabelecer imediatamente
alianças com outros movimentos, instituições, organizações que se mostrem disponíveis
para travar esse combate, integrando a barricada da resistência. Numa óptica
democrática, essa luta passa pela ampliação da oferta eleitoral. Um alargamento
que tem que ser esforçadamente construído, sendo tarefa deste aqui e agora, e
não de distante tempo.
Sem beliscar o empenho com que me
envolvi neste processo fundador, não posso também deixar de expressar a minha
convicção de que neste gravíssimo momento histórico toda e qualquer nova
organização política deve ter como primeira prioridade injectar moral e ética
no corpo político, assim como, em geral, no corpo societal. Lamento por isso
que o MDR não tenha definido expressamente como seu outro objectivo a feitura
de uma Lei Anticorrupção que altere a ineficaz legislação em vigor. A
quantidade de imoralidade à solta na sociedade e a banalização do acto imoral
ou eticamente reprovável corrói vorazmente o corpo da nossa debilitada
democracia. Os perigos e ameaças multiplicam-se. Agigantam-se. Impõe-se
derrotar o inimigo.
João Maria de Freitas Branco
Caxias, 16 de Junho de 2013